sexta-feira, 13 de abril de 2018

MARIELLE FRANCO - vereadora brasileira do PSOL

Imagem de divulgação


"Diversidade, mas em suma, resistência.
Inclusive, nesse momento, onde a democracia se coloca frágil, aonde se questiona se vai ter processo eleitoral ou não, aonde a gente vê todos os escândalos com relação ao Parlamento, falar das outras mulheres que lutam pela outra forma de fazer política num processo democrático é fundamental.

Inclusive, em tempos onde a justificativa da crise... (inaudível) obrigada, aonde a justificativa da crise na precarização, a dificuldade da vida das mulheres, é apresentada, mas com muita dificuldade real.

O tempo da escola, onde é que estão as vagas da creche que foi apresentada pelo Prefeito Marcelo Crivella, que iria ser ampliada, aumentada?

Aonde estão as educadoras e os educadores que não foram chamados ainda nos concursos?

Como ficam as crianças nesse período de intervenção ... enfim.

Não vem me interromper agora, né?
Mais homem fazendo 'homisse', meu Deus do céu... (recebe uma rosa de um homem) obrigada Ítalo, obrigada, amém, obrigada.

Obrigada aos vereadores, como falei antes e falo na Fiocruz no dia de hoje, as rotas da resistência nascem do asfalto. A gente recebe rosa, mas a gente vai estar com punho cerrado, também, e falando do nosso lugar de vida e de resistência contra os mandos e desmandos que afetam as nossas vidas.

Até porque não é uma questão do momento atual e, Vereador, na última semana em que falava sobre processo de violência sofrida pelas mulheres no carnaval, me questionava da onde eu tirava os dados apresentados.

As mulheres quando saem as ruas na manifestação, 08 de março, daqui a pouco, na Candelária, fazem porque, entre 83 países, o Brasil é o sétimo mais violento. E aí, volto a repetir, dados da Organização Mundial de Saúde.

Esse quadro segue piorando, aumentando, 6,5 no último ano, por dia, são 12 mulheres assassinadas no Brasil. O último dado, que a gente tem no Estado do Rio de Janeiro, figuram de 13 estupros por dia.

[Alguém grita na plateia: "Viva Ustra!"]

Essa é a relação com a violência contra as mulheres.

A gente tem um senhor que está defendendo a ditadura e falando alguma coisa contrária a isso?!

Eu peço que a presidência da Casa, no caso de maiores manifestações que venham atrapalhar a minha fala, assim proceda como a gente faz quando a tribuna interrompe qualquer vereador.

Não serei interrompida!
Não aturo interrompimento dos vereadores desta Casa, não aturarei de um cidadão que vem aqui e não sabe ouvir a posição de uma mulher eleita!
Presidente da Comissão (inaudível) da Casa.

[Pressidência pronuncia-se]

Obrigada. Não, imagina.

[Presidência pronuncia-se determinando que os seguranças fiquem atentos a tais peeturbações]

Obrigada Presidenta Tânia, até porque sabemos que, infelizmente, eses casos não será a última, nem a primeira vez, mas o empate para quem vem da favela, e minha fala está falando da violência contra as mulheres nesses 20 minutos, nós somos violadas e violentadas há muito tempo e em muitos momentos.

Nesse período, por exemplo, onde a intervenção federal se concretiza na intervenção militar, eu quero saber como ficam as mães e familiares das crianças revistadas.

Como que ficam as médicas que não podem trabalhar nos postos de saúde. Como que ficam as mulheres que não têm acesso à cidade.

Essas mulheres são muitas. São mulheres negras, mulheres lésbicas, mulheres trans, mulheres camponesas, mulheres que constrõem esta cidade, aonde diversos relatórios, querendo os senhores ou não, apresentam a centralidade e a força dessas mulheres, mas apresentam, também, os números como o (inaudível) do dossiê de Lesbocídio, que, no ano de 2017, houve uma lésbica assassinada por semana.

Lesbocídio é um conceito que as mulheres lésbicas estão cunhando, assim como nós avançamos no debate com relação ao homicídio impetrado por mulheres que constituiam o feminicídio, dados que mostram a realidade absurda, mas que, sim, vitima a nossa diversidade.

As mulheres negras, por exemplo, quando passam na rua, ainda tem homem que tem a ousadia de falar do quadril largo, da bunda grande, do corpo como se a gente estivesse no período de escravidão.

Não estamos, querido.
Nós estamos no processo democrático. Vai ter que aturar mulher negra, trans, lésbica, ocupando a diversidade dos espaços.

(Inaudível), por exemplo, faz alusão ao militarismo, tem a audácia de vim querer gritar no processo da República Democrática hoje.

Nós rejeitamos, nesta Casa, o que poderia ser o processo de armamento. Outros municípios negaram.

Não tem eco o lugar aonde, nem a Polícia Militar está hoje preparada para utilizar arma de fogo e, para contextualizar, alguém viu o que aconteceu na Praça São Salvador ontem?
Pois é.

Felizmente, os guardas municipais que estavam lá, que não estavam armados, correram para se proteger assim como todos os outros cidadãos.

Porque se ali tivesse sacado arma de fogo, certamente, teriam sido assassinados e perderíamos mais vidas dos servidores públicos da Cidade do Rio de Janeiro.

É por isso que homens e mulheres que pensam no processo democrático são contrários ao que pode vitimar ainda mais a nós, população da Cidade do Rio de Janeiro, contrário a esse argumento.

Em termos de violência, de negação de direitos, mais armas vai ser retiradas de direito.

A condição, a saída são condições dignas de trabalho pra esses trabalhadores e trabalhadoras.

E por essas e outros e vários motivos que a gente defende, sim, a presença de mais mulheres.

Queria saudar a presença da Vereadora Rosa Fernandes, uma referência, por mais que tenhamos divergências, diferenças de partido, é uma mulher que me acolheu, recebe, trata com o respeito devido.

A Vereadora Tânia Bastos falou novamente, fico feliz (inaudível) mulheres na luta.

O movimento que nós fizemos com mais mulheres no espaço de decisão é pra que as políticas públicas entendam porquê de um vagão necessário em tempos de assédio. É pra quê nós possamos falar de mobilidade a partir da perspectiva de gênero. É pra quê a gente possa falar de economia solidária.

Saudadas da Edjane, da Cristina, da Juliana, da Simone, das mulheres que aqui estão, da Renata Stuart, enfim, do meu corpo de assessoria, das mulheres que constrõem esse mandado, elaboram essa política bo afeto.

É, todas elas, Naldo. O mandato é composto, não só, elas não são todas elas da equipe, mas o mandato é composto 80% de mulheres, porque a gente entende que o lema de que a gente fala de que 'uma mulher sobe puxa a outra' precisa ser concretizado.

Uma escritora que eu gosto muito chamada Yogananda fala que só vai ser alterado se as mulheres que estão no espaço de poder, de fato, trouxerem, derem o pé, abraçarem, acolherem, construírem com outras mulheres.

Se esse Parlamento é formado apenas por 10, 3% de mulheres, nós somos a maioria na rua. E sendo a maioria na rua somos forças exigindo dignidade e o respeito das identidades aonde, infelizmente, o que está colocado aí nos vitima ainda mais.

O lema desse ano que daqui a pouco estaremos na Candelária, um dos lemas do que a gente coloca, sim, de valorização da vida das mulheres é quando as mulheres internacionalistas falam 'pára' na greve internacional; é quando mulheres falam, sim, nós somos diversas, mas a gente não está dispersa, não.

A gente está construindo uma sociedade que, de fato, sendo a base da pirâmide, constrói essa cidade, assim como construiu a Maestrina Chiquinha Gonzaga que, daqui a pouco, no final do dia, nós estaremos, aqui, felicitando homens; nós, homens; nós, os parlamentares, nós, mulheres; estaremos feicitando, aqui, com a medalha Chiquinha Gonzaga, a Dida, que é uma mulher que faz política com afeto, gastronomia, que organiza o lugar de resistência na Praça da Bandeira, aonde esse lugar das mulheres negras potente de encontro, com a Dida, pára.

E pra encerrar, eu gostaria de reforçar e dizer, das mulheres negras que são nossas referências, de citar a Audre Lorde, que é uma mulher negra, lésbica, escritora caribenha, com origem caribenha, mas dos Estados Unidos, feminista e ativista pelos direitos civis:
'Eu não sou livre enquanto outra mulher for prisioneira, mesmo que as correntes delas sejam diferentes das minhas.'

Por isso, nós vamos juntas lutando contra toda a forma de opressão. Tem uma diversidade de luta, na pauta pela vida das mulheres, na pauta pela legalização do aborto, na pauta pela luta das maternidades, da cultura, do empreendedorismo, das mulheres da Zona Oeste, e, acho que é fundamental agradecer, nesse final, nominalmente, a Elaine, a Júlia, Vitória, Mônica, Fernanda, a Fabíola, Mariana, Alana, Lussana, a Priscila, Renata, Iara, Bruna, Rogéria, Natália e Luna.
As mulheres que constrõem esse história, que estão junto comigo.

[Presidência manifesta-se]

Quero agradecer a Vereadora Tânia Bastos."

[Coro de mulheres na tribuna: 'Nenhuma a menos, juntas venceremos!'
A nossa luta é todo dia, porque mulher é maioria!']"

(Marielle Franco, em discurso na Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro, no Dia das Mulheres, 08/03/2018, último antes de seu falecimento.)

(Obs.: Transcrição pelo blog "inscrituras.blogspot.com" de áudio do discurso, conforme proferido "ipsis literis". Os trechos/palavras inaudíveis se deram em decorrência do barulho na tribuna.)

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