sábado, 28 de março de 2020

"GASLIGHT" (1940) - cinema



Gaslight é um filme de 1940 que trata de um comportamento psicótico homônimo, hoje, "gaslighting".

O termo vem sendo muito conhecido pelo movimento feminista. 

Deriva de uma técnica em que um marido psicopata, em abuso psicológico e emocional contra sua esposa, alterava o fluxo de gás das lamparinas da casa, utilizadas na época, com a finalidade de acusá-la de estar perdendo a sanidade ao ver coisas que não aconteciam.

Torturava a esposa escondendo objetos e acusando-a de ter pegado ou escondido, chamando-a de mentirosa, louca, insana.

Gaslighting é um distúrbio mental grave caracterizado por abusos diversos, emocional, psicológico, físico, patrimonial etc., que uma pessoa inflinge sobre sua vítima. Pode ser traço de outras psicopatologias, como a psicopatia, personalidade narcisista.

Seria complexo aprofundar sobre a finalidade, mas, a princípio, suprimento do sentimento de inferioridade do abusador, que se abastece do poder sobre a vítima para se sentir bem.

A obra cinematográfica é esclarecedora para estudos sobre o assunto, independente de qual área seja.

Linguagem simples, clara, sem rebuscamento, apesar dos recursos de cinema incipientes.

Percebe-se que foi fonte de outras obras, como a novela "O Profeta", escrita, originalmente, por Janete Clair, com remake posterior.

Indicado para grupos que possam compreender o assunto ou estejam sendo preparados para isso. Mulheres, essencialmente, ressaltando que é um gatilho potencialmente perturbador.


"Gaslight" (1940)

Considerações diversas

O filme traz muitas outras reflexões além do tema abuso, principalmente, questões psicológicas relacionas a isso.

Vou expondo os conflitos sobre os quais pensei assistindo à obra.

Primeiramente, como dito sobre gatilho, vítimas irão se identificar. E é doloroso, angustiante, assustador.

É possível compreender abusos sofridos vendo "de fora" da situação, ao mesmo tempo, em que há reconhecimento de si vivenciando situação igual ou muito próxima.

A própria empatia típica da vítima é inerente a esse reconhecer-se no outro e perceber-se vítima. Passa-se a questionar o outro e você mesmo, em como a autorresponsabilidade sobre nós mesmos pode nos tornar vítimas ou saber safar-se da situação.

Percebo que o abuso tem, intrinsecamente, um aniquilamento das defesas da vítima. E até que ponto é possível defender-se e responsabilizar-se pelas situações a que se submete ou atribuir o abuso tão somente ao abusador?

Fala-se muito sobre a culpa nunca ser da vítima. E procede. Entretanto, em sessão de análise psicanalítica, a analista abordou a minha posição e responsabilidade de estar naquela situação. Ainda estou pensando - e estudando - sobre.

Pude perceber, também, que é usual que repitamos padrões familiares. Ao investigar certo comportamento, certamente, há alguma reprodução de modelos já vivenciados no âmbito da família, seja em posição "ativa" ou "passiva" (vítima).

E a própria capacidade de retirar-se da situação de abuso, também, vem de habilidades adquiridas em desenvolvimento familiar, aprofundadas ou não pelo lívre-arbítrio.

Em última instância, somos frutos de nossa criação, mas podemos escolher outras formas sociais de acordo com o que sentimos e como nos posicionamos diante disso. Não dá pra colocar a culpa nos pais e não fazer nada em prol de si, embora nada fazer é uma das escolhas.

Daí, o conceito de família pode ser discutido. Não pretendo adentrar essa discussão, nem é relevante para o abordado no momento, mas é algo que merece atenção, sobretudo às funções materna e paterna na formação de uma pessoa. Lembrando que me referi à função e não ao gênero de quem a exerce.

O assunto e todas suas ramificações são direcionados à proteção da vítima primordialmente. Contudo, como extrema empata, penso no outro lado: como poderia ser inserido o tema para recuperação do abusador.

A sociedade preocupa-se com a vítima por razões óbvias maniqueístas - salve o bem e abomine o mal. Porém quem seria o mal? Não há duplicidade de papéis em algum momento? Quem vai olhar para o agressor, que não deixa de ser uma vítima da sua própria mente, autofágico.

Tudo indica que as pessoas tendem a posicionar-se em prol da defesa do local onde esteve. E, quase, unanimemente, o sofrimento da vítima revela-ss mais pungente a ponto de procurar ajuda.

Talvez, o próprio distúrbio do agressor carregue consigo características típicas da personalidade que o impedem de enxergar o prejuízo que causam (ausência de empatia), dificuldade em reconhecer falhas em si, fragilidade de ego que não suporta ser posta em cheque etc.

Volto a pensar: vítimas devem ser tratadas e recuperadas e o que fazer com agressores irreversíveis, por exemplo? Ainda não sei.

Por Fiametta F.




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